Uma história que incomoda o Planalto: os seis meses do caso Queiroz
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O senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) com o antigo assessor Fabrício Queiroz
O Estado mostrou em 6 de dezembro do ano passado que uma investigação sobre um suposto esquema de corrupção na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) descobriu movimentações bancárias atípicas do policial militar Fabrício Queiroz, um obscuro ex-assessor do gabinete do então deputado estadual Flávio Bolsonaro (PSL-RJ). Em um ano, R$ 1,2 milhão transitou pelas contas do ex-assessor, segundo o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), arrastando o gabinete do filho do presidente Jair Bolsonaro para o centro de uma investigação do Ministério Público Estadual. Promotores apontam indícios de que uma organização criminosa foi montada no gabinete de Flávio, o 01 do presidente, para desviar dinheiro dos salários dos funcionários, a chamada “rachadinha”. O dinheiro teria sido lavado por meio da compra e da venda de pelo menos 19 imóveis no Rio. Com a quebra dos sigilos bancário e fiscal de 86 pessoas e nove empresas, a investigação sobre o caso avança, pressionando o governo Bolsonaro. “Venham pra cima, não vão me pegar”, disse o presidente logo depois de a Justiça decidir autorizar a devassa nas contas de seu filho. Desde dezembro, quando o caso foi revelado pelo Estado, a promotoria tenta ouvir Queiroz e hoje senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), sem sucesso. O ex-assessor foi visto pela última vez quando se internou no Hospital Albert Einstein, em São Paulo, para tratar um câncer. O “sumiço” de Queiroz se tornou uma sombra para o governo, eleito sob a bandeira do combate à corrupção. A reação de Flávio foi acusar o MP de querer persegui-lo para atingir o pai. Dizendo-se vítima de quebra ilegal do sigilo de seus dados, o senador foi à Justiça três vezes para tentar bloquear as investigações. Sem sucesso. Algumas perguntas permanecem sem respostas. A mais urgente delas: onde está o Queiroz? Vinte e cinco dias após a eleição do presidente Jair Bolsonaro, uma notificação do Ministério Público do Rio chega a um prédio na Praça Seca, bairro da zona oeste da capital fluminense. Era uma intimação para que o policial militar da reserva Fabrício José Carlos de Queiroz fosse prestar depoimento em um inquérito sigiloso no qual estava sendo investigado por movimentações financeiras atípicas detectadas pelo Coaf no período em que foi assessor do então deputado estadual Flávio Bolsonaro (PSL). Mas Queiroz não estava lá. Débora Melo Fernandes recebe o documento e avisa o ex-marido, que teria se mudado para Taquara, em Jacarepaguá, que o promotor Bruno Gaspar, do Grupo de Atribuição Originária em Matéria Original (Gaocrim), queria ouvi-lo às 14h do dia 4 de dezembro de 2018. Na véspera da oitiva, o advogado Cezar Tanner, recém-constituído por Queiroz, diz que já tinha uma audiência marcada para essa data, pede acesso ao inquérito e combina com o investigador do caso uma nova data para o depoimento: 6 de dezembro, às 14h. Mas Queiroz não compareceu. Naquele dia o Estado revelava as suspeitas envolvendo as transações bancárias do assessor de Flávio e amigo do presidente Bolsonaro. Surpreso com a reportagem, o advogado de Queiroz pede novo adiamento e se queixa de não ter tido acesso a todo conteúdo sob investigação. “Além disso, no dia de hoje o jornal Estadão divulgou uma matéria a respeito dos fatos objeto do procedimento em referência, constando de tal matéria detalhes que não foram disponibilizados à defesa, como um suposto cheque no valor de R$ 24 mil destinado a Michelle Bolsonaro”, reclamou a defesa.O depoimento, então, é reagendado para o dia 19 de dezembro.Mas, novamente, Queiroz não aparece. Desde que o caso Queiroz veio à tona, o “coordenador da segurança” de Flávio, função descrita pelo próprio ex-assessor, se recolheu. Concedeu uma única entrevista no dia 26 de dezembro, ao SBT, na qual disse que fazia dinheiro com compra e revenda de carro, mas não explicou os depósitos feitos por outros assessores em sua conta bancária. “Em respeito ao MP e vou prestar esses esclarecimentos a eles”, disse na ocasião. Queiroz, porém, já havia faltado ao depoimento remarcado para o dia 21 de dezembro, alegando problemas de saúde, e também não iria ao encontro com o promotor agendado para o dia 8 de janeiro deste ano. Laudos médicos e fotos enviadas ao MP pelo advogado Paulo Klein, novo defensor da família Queiroz, atestam que o ex-assessor foi submetido a uma cirurgia para retirada de um tumor maligno no intestino, no primeiro dia do ano, no Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo. Desde então, segundo a defesa, ele segue em tratamento e recuperação na capital paulista ao lado das filhas e da mulher, todas ex-assessores de Flávio Bolsonaro que também faltaram aos depoimentos marcados pelo Ministério Público. Apenas no dia 28 de fevereiro, Paulo Klein encaminha a versão de Queiroz sobre os fatos aos promotores. No documento, o ex-assessor admite que arrecadava parte do salário dos colegas de gabinete, mas com o consentimento deles e sem o conhecimento de Flávio, para pagar assessores externos informais, sem vínculo formal com a Assembleia Legislativa do Rio. O objetivo, diz, era alavancar o desempenho eleitoral do então deputado estadual. Enquanto isso, o filho mais velho de Bolsonaro, já eleito senador, tentava barrar na Justiça a investigação do MP do Rio, alegando que os promotores quebraram seu sigilo bancário sem autorização judicial. Até o momento, nenhuma das três tentativas prosperou. A afirmação de Queiroz sobre a arrecadação de recursos de outros assessores dentro do gabinete de Flávio fortaleceu a tese que o Ministério Público do Rio, até então acuado pelas críticas feitas pelo clã Bolsonaro e sua rede de apoio na internet, revelaria apenas em abril, quando pediu a quebra de sigilo bancário e fiscal de 86 pessoas e 9 empresas ligadas ao gabinete e aos negócios do filho mais velho do presidente da República. Os promotores sustentam que há indícios robustos de que uma organização criminosa comandada por Flávio Bolsonaro e operada por Fabrício Queiroz desviou recursos públicos por meio da devolução parcial de salário pelos assessores, prática conhecida como “rachadinha”, e lavou dinheiro fazendo transações imobiliárias com valores de compra e venda fraudados. Leia mais no Estadão.
Estadão Conteúdo