A ascensão e a vergonhosa queda do Brasil no G20
Por Osvaldo Bertolino
A mesma opinião é compartilhada pelo economista Carlos Braga, professor da Fundação Dom Cabral (FDC). Para ele, a participação da comitiva brasileira se limitará em acompanhar os principais debates que centralizarão o encontro do G20. “Para o Brasil, ainda mais em mudança de governo, será uma expectativa de quem assiste da plateia. No passado o país teve um papel mais importante (nas discussões do G20), afirmou”.
O Brasil como locomotiva
O G20, grupo que reúne 19 grandes economias (África do Sul, Alemanha, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, Brasil, Canadá, China, Coréia do Sul, Estados Unidos, França, Índia, Indonésia, Itália, Japão, México, Rússia, Reino Unido e Turquia), mais a União Europeia, se reúne há exatos dez anos depois que em novembro de 2008 seus líderes se encontraram em Washington, a capital norte-americana, para, segundo eles, coordenar uma reação à crise financeira global. Foi o primeiro encontro em que o G20 passou de um fórum de ministros de finanças para um encontro de chefes de Estado e governo. Ao voltar ao Brasil, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que o encontro mudava “a lógica das decisões políticas”.
Naquela época, o Brasil era tido como promessa de locomotiva para recuperação mundial e tinha a liderança carismática de Lula, saudado pelo então presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, como “o cara” — além do seu protagonismo no BRICS (Rússia, Índia, China e África do Sul). Na Presidência da República, Lula combateu os competidores internacionais em duas frentes — no quintal brasileiro e no quintal deles. Ao se transformou em uma economia relevante no mercado internacional, com um comércio exterior respeitado inclusive no terreno político — como demonstrou o desempenho brasileiro no G20 e na Organização Mundial do Comércio (OMC) —, o Brasil, sob a liderança de Lula, chegou à relevância internacional basicamente por meio do protagonismo do governo, que atuou de modo firme e eficaz junto aos parceiros comerciais, gerando acordos bilaterais e multilaterais.
Perigo existencial
Na reunião de Buenos Aires, as previsões são de que o debate incluirá temas como acordos financeiros, tensões diplomáticas e crises migratórias. Contudo, o assunto que vem recebendo mais atenção da mídia é a guerra comercial dos Estados Unidos com a China. No fim de setembro, o governo norte-americano iniciou a taxação de 10% em cima de diversos produtos chineses, somando US$ 200 bilhões. À época, o presidente norte-americano Donald Trump já havia avisado que o índice seria elevado para 25% nos primeiros dias de 2019. Em retaliação, a China também elevou barreiras para a importação de milhares de produtos dos Estados Unidos e prometeu subir o tom caso as ameaças norte-americanas se concretizem.
De acordo com a BBC Brasil, também estará no foco do G20 a necessidade de reforma da OMC. Os Estados Unidos têm bloqueado a nomeação de novos juízes para o órgão de apelação, espécie de corte suprema dos conflitos comerciais, e ameaça deixar a organização. “A situação do G20 hoje é muito mais precária. Trump representa uma visão internacional que enfatiza a competição”, ressalta o professor de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Matias Spektor, ao analisar a última década.
Spektor ressalta, porém, que o problema não está localizado apenas nos Estados Unidos e a crescente tensão com a China. O Reino Unido, cujo então primeiro-ministro Gordon Brown teve papel fundamental na inclusão dos países emergentes na mesa de discussão da crise financeira em 2008 e 2009, hoje está enfraquecido sob a liderança de Theresa May por causa da implementação do plano de saída da União Europeia, o Brexit, aprovado em 2016.
Ele disse à BBC Brasil que a Alemanha também perde capacidade de liderança diante da expectativa de troca de comando — Angela Merkel, chanceler alemã desde 2005, anunciou que não tentará a reeleição em 2021 depois que seu partido teve desempenho fraco em pleitos regionais. É possível que ela deixe o comando do país ainda antes. “Além disso, em 2009, os líderes enfrentaram um perigo comum, claro e presente de um colapso financeiro e econômico global. Hoje, eles estão lidando com questões menores e mais lentas, como o comércio, e ainda não perceberam o perigo existencial trazido agora pelas mudanças climáticas descontroladas”, acrescentou.
Base militar no Uruguai
O G20 reúne 85% do produto global, dois terços da população mundial e 75% do comércio internacional, além de um pouco mais de 80% dos investimentos globais para o desenvolvimento de pesquisas. Além dos países-membros e convidados especiais, as principais organizações regionais, como a Associação das Nações do Sudeste Asiático (Asean) e a União Africana, a Nova Parceria para o Desenvolvimento da África (Nepad) e a Comunidade do Caribe participam das cúpulas (Caricom).
Há, ainda, organizações multilaterais, como o Banco Mundial, o Conselho de Estabilidade Financeira (FSB), o Fundo Monetário Internacional (FMI), as Nações Unidas, a Organização Internacional do Trabalho (OIT), a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e OMC.
Durante a cúpula, segundo a agência de notícias Sputnik, os Estados Unidos pretendem instalar uma base de operações no território uruguaio para garantir a segurança do evento. “Em Montevidéu se ouvem muitas vozes de objeção contra a logística militar do Pentágono. O deputado uruguaio de esquerda, Eduardo Rubio, declarou em diálogo com a que posicionamento de oito aviões e de 400 militares representa de fato uma ‘pequena ocupação’ do Uruguai pelas forças de Washington”, de acordo com a Sputnik.