Aos 15 anos, jovem tira nota máxima em ‘Enem’ da Islândia e é destaque na imprensa estrangeira: ‘Inacreditável’
Beatriz Ladeira, de 15 anos, superou as barreiras da língua e foi considerada a melhor estudante daquele país. Família de Jundiaí (SP) se mudou em 2016 para fazer evangelização.
Nascida em Jundiaí, no interior de São Paulo, Beatriz Ladeira contou ao G1que, apesar de ter ficado desesperada, ser considerada a melhor estudante da Islândia foi uma surpresa: “É uma coisa inacreditável”.
A ilha, que fica no norte do Oceano Atlântico, foi colonizada pela Dinamarca e conta com uma população de 350 mil habitantes, cerca de 60 mil a menos que Jundiaí.
Beatriz, os pais e quatro irmãos, de 2 a 13 anos, se mudaram em pleno verão de 2016 para Reykjavík, capital do país, após serem aprovados em um programa de evangelização da Igreja Católica.
A “Samrændu próf” (“Prova Uniforme”, em português) surgiu na vida da jovem no fim de 2017, mais ou menos no meio do ano letivo – lá os estudos começam em agosto e terminam no início de junho. Segundo Beatriz, o teste é parecido com o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) em nível de importância.
“É uma prova difícil em que todos os estudantes começam a se preocupar logo após o Natal. Diferente do Enem, você não precisa necessariamente dela para entrar no colegial, mas, se for bem nela, com certeza te ajuda a entrar na melhor escola”, explica.
“Muitas vezes eu me desesperava, não entendia nada. Havia poemas e textos de séculos atrás, regras gramaticais que era praticamente impossível de entender, conta.
A adolescente diz que a nota da prova é representada em letras e porcentagem.
“Achei que fosse tirar C+ ou, no máximo, B. Quando recebi minha prova de matemática e tirei 100%, foi um choque. Tirar 100% significa que ninguém foi melhor do que eu. Dias depois, veio o A nas provas de islandês e história.”
“Eu vejo que a Beatriz tem um grande dom da perseverança. Fiquei extremamente orgulhosa do resultado e do esforço. Ficamos todos muito agradecidos a Deus e à professora dela. Tudo foi uma linda história”, comenta a mãe da menina, Aline Soares Ladeira.
A linguista Mônica de Araújo Dalla Vecchia afirma que, além das questões fonéticas e de identidade – que dificultam o entendimento de expressões e piadas –, o islandês evoluiu pouco nos mais de mil anos de registro escrito.
“Talvez por Beatriz ter passado por uma dificuldade inicial da língua, ela tenha ficado ainda mais atenta à gramática, interpretação e às pistas que o texto oferece e isso justifique essa bela performance na prova”, diz.
O destaque na imprensa veio após a repórter Inga Rún Sigurðardóttir, do veículo islandês MBL.is, entrar em contato com a jovem pedindo para fazer uma reportagem com ela.
“Achei que seria uma entrevista pequena e que se tratava de um jornal de bairro, mas, na verdade, era um jornal de circulação nacional e minha matéria saiu na capa”, comemora.
Ao G1, a jornalista disse que a nota de Beatriz, uma estrangeira, é algo extraordinário no país. “O fato mais interessante é que ela mora no país há apenas um ano e meio. Sabemos que ninguém no país teve uma nota tão boa quanto a dela no teste de matemática.”
“Posso dizer que, após a minha reportagem, ela se transformou em um modelo positivo para outros alunos”, afirma.
‘Tubarão podre’
O fuso horário de três horas a mais talvez tenha sido a mudança menos significativa na vida da família de Beatriz, que se propôs a ir para qualquer país que a igreja a mandasse.
No início, ela falava apenas inglês e espanhol e lembra que muitas vezes se sentiu sozinha, porque as meninas da idade dela não faziam questão de ter longos diálogos em outro idioma com uma estrangeira.
“Foi aí que eu fiz um trato comigo mesma e prometi que só falaria islandês, mesmo que errado. No começo, eu demorava muito para entender, formar frases, mas foi indo, até minha relação com as pessoas melhorar”, lembra.
Para ela, duas coisas continuam chamando atenção mesmo após dois anos: a comida e o custo de vida. De acordo com Beatriz, ela ainda não se acostumou com o “kæstur hákarl”, ou “tubarão podre”, arroz com mingau, salsicha de fígado de ovelha, entre outros.
Mesmo com toda a felicidade de ter vencido as barreiras do idioma e conseguido se relacionar em um país com uma cultura totalmente diferente, Beatriz ainda se considera tímida e “em choque”.
“É sempre um choque. Primeiro eu aprendi a falar islandês, depois tirei A e 100% nas provas, sem querer fui destaque de um jornal nacional da Islândia. Para onde mais a vida vai me levar?”, indaga.
Fonte:G1