CPI: Documentos mostram que governo ignorou a Pfizer 10 vezes em 1 mês
Há provas de que a primeira proposta da empresa, de 30 milhões e 70 milhões de doses, foi formalizada em 14 de agosto
Um compilado de provas documentais entregues pela Pfizer à CPI da Covid mostram que a farmacêutica insistiu em negociar a venda de vacina contra a Covid-19 com o Brasil, sendo ignorada por diversas vezes pelo governo federal. Os e-mails mostram que, em apenas um mês (14 de agosto a 12 de setembro de 2020), a Pfizer foi ignorada dez vezes.
Os documentos apresentados à CPI correm em sigilo, mas foram obtidos Folha de S.Paulo. Segundo reportagem do jornal, o material comprova que a primeira oferta da empresa foi formalizada ao Brasil em 14 de agosto, de 30 milhões e 70 milhões de doses, e tinha validade até o dia 29 daquele mês.
Após o envio do documento, a Pfizer mandou emails por três dias cobrando resposta até que uma representante da farmacêutica telefonou para uma técnica da Sctie (Secretaria de Ciência, Inovação e Insumos Estratégicos) do Ministério da Saúde.
“Desculpe, a ligação caiu e não consegui mais contato. Espero que esteja tudo bem com vc! Só queria confirmar se vcs receberam ontem uma comunicação enviada em nome do presidente da Pfizer, Carlos Murillo, com a proposta atualizada de um possível fornecimento de vacinas de Covid-19. Vc me avisa? (sic). A validade das propostas continua sendo a mesma, até 29 de agosto de 2020, e gostaria de saber, com urgência, do interesse deste ministério em iniciar conversações sobre aspectos legais e jurídicos da presente proposta”, escreveu Cristiane Santos, da Pfizer.
A oferta da Pfizer previa início de imunização em dezembro do ano passado, com 1,5 milhão de doses e mais 3 milhões no primeiro trimestre deste ano. O Ministério da Saúde brasileiro só firmou acordo com o laboratório em março de 2021, quando adquiriu 100 milhões de doses — das quais 14 milhões devem ser entregues até junho, e o restante até setembro deste ano.
Veja a cronologia dos emails entre a Pfizer e o Ministério da Saúde:
31 de julho de 2020
Pfizer pede audiência urgente com a pasta. País registrava cerca de 92,5 mil mortes
4 de agosto de 2020
Ministério confirma reunião para dia 6 de agosto
8 de agosto de 2020
País ultrapassa marca de 100 mil mortos por Covid-19
14 de agosto de 2020
Empresa envia a proposta formal para fornecimento de futura vacina. Previsão era de 70 milhões de doses, acima das 30 milhões discutidas anteriormente
17 de agosto de 2020
Envia um email a técnicos da Saúde um link para acessar documentos com informações sobre a vacina e a proposta. Envia um segundo email a técnicos da Economia informando sobre a proposta que havia sido feita.
18 de agosto de 2020
Pfizer afirma que consegue antecipar 1 milhão de doses para entrega em ainda 2020, após aval da Anvisa. Email reforça que a validade da proposta era 29 de agosto e pede urgência para resposta
19, 21, 25 e 26 de agosto de 2020
Pfizer faz contato telefônico e eletrônico e pede uma posição do ministério. Envia proposta com revisão no cronograma e entrega de doses
29 de agosto de 2020
Data limite da primeira oferta. Não há documento entregue pela Pfizer à CPI referente a este dia. Mortes por Covid-19 passam de 120 mil
2, 12 e 15 de setembro de 2020
Pfizer faz novo contato com ministério e se coloca à disposição para reunião sobre o andamento dos estudos da vacina. No período, presidente mundial da Pfizer encaminha mensagem a Bolsonaro e Pazuello. Empresa diz que fechou acordo com os Estados Unidos e reforma que celeridade é crucial, pois há número limitado de doses em 2020. Email enviado ao presidente Bolsonaro e ministros é encaminhado a integrantes do Ministério da Saúde
14 de outubro de 2020
Número de mortes já passava de 150 mil no país. Empresa envia dados ao Programa Nacional de Imunizações
27 de outubro de 2020
Reunião entre Pfizer e governo para retomar as negociações
10 de novembro de 2020
Pfizer tem reunião com Bolsonaro, Guedes e Wajngarten. Foi reapresentada a proposta de 70 milhões de doses, com um mínimo a ser adquirido no primeiro semestre e o restante no segundo semestre. Empresa reforça que contrato será efetivado somenta após aval da Anvisa, “sem qualquer risco/prejuízo financeiro ao país caso nossa vacina não receba o registro”
13 de novembro de 2020
Número de mortes chega a quase 165 mil. Ministério confirma reunião com a empresa para 17 de novembro
Dia 24 de novembro de 2020
Pfizer manda termos atualizados do acordo. Validade da proposta é 7 de dezembro. Depois disso, doses serão distribuídas a outros países
2 e 3 de dezembro de 2020
Empresa tenta contato telefônico e eletrônico, relata ter deixado inúmeras mensagens, mas não obteve a resposta
4 de dezembro de 2020
Ministério enviar uma contraproposta à empresa
6 e 9 de dezembro de 2020
Pfizer pede reunião para discutir contraproposta e mostra que memorando de entendimento depende de medida provisória do governo, ainda a ser editada
10 de dezembro de 2020
Ministério fecha memorando de entendimento com a Pfizer. Brasil chega perto de 180 mil mortes
Fonte: Bahia-BA