Farmacêuticas de Cannabis investem na formação de médicos e captação de pacientes
Farmacêuticas que atuam no mercado da maconha medicinal têm investido na criação de plataformas digitais com objetivo de cadastrar e treinar médicos para a prescrição de medicamentos à base de Cannabis, captar pacientes e vender seus produtos. Esses serviços conectam pacientes a médicos que prescrevem canabinoides e a empresas que produzem e revendem esses produtos importados. Também acompanham o paciente no processo de reunir a documentação necessária, obter a autorização da Anvisa, comprar e importar a medicação e no tratamento. Para representantes de conselhos médicos, há conflitos de interesse nessa situação e falta isenção na educação médica oferecida pela indústria que, muitas vezes, só quer promover a própria marca.
As empresas também podem incorrer em ações antiéticas ao vender seus produtos diretamente para os pacientes, além de reter informações confidenciais do prontuário. Das plataformas atuantes hoje no país, apenas a Dr. Cannabis não está vinculada a nenhuma marca de produto. Ela tem 4.000 pacientes e 400 médicos cadastrados (dos quais 70 prescrevem os remédios ). “É uma plataforma isenta, que vende produtos de terceiros e tenta conseguir o melhor preço para o cliente. As outras vendem ou representam seu próprios produtos”, diz Viviane Sedola, CEO e fundadora da Dr. Cannabis.
Para ela, as empresas que atuam no Brasil foram obrigadas a criar esse tipo de estrutura, caso contrário não conseguiriam atuar. A empresa OnixCan/Cantera tinha até meados de agosto 330 médicos cadastrados, dos quais 20 usam a plataforma para a prescrição de produtos. O site oferece cursos a médicos de dois dias a preços que variam de R$ 770 a R$ 990. Neles são expostos indicações terapêuticas dos remédios à base de Cannabis, trâmites para a prescrição e a parte jurídica para o acesso. “As principais dúvidas deles são: como eu prescrevo? Com o que eu tenho que tomar cuidado? Qual é a dose mínima, qual a dose máxima? Como aumento a dose?”, diz o advogado Marcelo Galvão, CEO da OnixCann/Cantera.
Para cada doença, há um conjunto de estudos científicos que respaldam a indicação, segundo Galvão. “Ninguém questiona o uso da Cannabis para essas 23 patologias. São evidências suficientes para qualquer médico prescrever. Nenhum conselho [médico] poderá adotar qualquer medida coercitiva ou punitiva contra esse médico”, diz ele. Segundo ele, muitas vezes, os conselhos assustam os profissionais, o que os deixam inseguros para prescrever a substância. “O CFM pode errar, é um assunto novo.” Para Galvão, ao ter acesso às evidências científicas “fortes, médias e fracas” sobre benefícios e segurança do uso das medicações à base de Cannabis, o médico tem todo o amparo para prescrever.
A ideia, segundo o advogado, é que toda a consulta com o paciente fique cadastrada na plataforma. “Todas as perguntas de anamnese e todo resultado de tratamento vão ficar registrados no prontuário.” Mas e a segurança de dados sigilosos do pacientes? “A gente segue toda a legislação de sigilo. Só o médico e quem cuida do sistema têm acesso aos detalhes do paciente. Quando a gente tabula as informações pode fazer isso sem individualizá-las. Coloca, por exemplo, só a faixa etária e o sexo.”
A Verdemed Care dispõe de plataforma com finalidades semelhantes, como interação com o público em geral sobre informações sobre a Cannabis medicinal e como acessá-la, além de área restrita a médicos, com literatura técnica, estudos clínicos e oferta de cursos de formação sobre a Cannabis medicinal. José Bacellar, presidente da empresa, não vê problemas éticos no fato de as farmacêuticas estarem promovendo a educação médica sobre Cannabis.
Folha de S.Paulo