‘Pente-fino’ da Funai aponta sucateamento de frota de aviões
Foto: Dida Sampaio / Estadão
Damares Alves
Um relatório interno da Fundação Nacional do Índio (Funai) identificou nove aeronaves sucateadas que deveriam garantir atendimento médico para a população indígena de todo o País. Das aeronaves sob a responsabilidade da Funai, três estão em estado irrecuperável, uma acidentada e o restante inoperante. O documento obtido pelo Estado alerta para a situação de descaso e abandono da frota, com risco até de incêndio no caso de aeronaves que estão estacionadas em gramado no aeroporto internacional de Brasília. De acordo com o presidente da Funai, Fernando Melo, só o aluguel atrasado com o estacionamento das aeronaves em Brasília já chega a R$ 3 milhões – o triplo do valor que estimado com o leilão das aeronaves nas próximas semanas (R$ 1 milhão). O risco de incêndio ali se deve ao fato de as aeronaves estarem estacionadas no gramado, “um material de fácil combustão” especialmente no período de seca, de acordo com o relatório. O governo também esbarra em outro problema apontado pelo relatório: quanto maior o tempo em que uma aeronave permanecer inoperante e desabrigada, maior será o custo financeiro necessário à sua recuperação. “Qualquer gestor público ficaria horrorizado com uma situação dessas. Deve ser aberta sindicância para apurar por que a frota ficou abandonada e se deteriorando ao longo do tempo”, disse Melo ao Estado. Essas aeronaves eram utilizadas para levar vacinas e medicamentos a regiões indígenas, além de transportar equipe médica e técnicos para visitar as regiões. Em 2010, um decreto assinado pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva transferiu a responsabilidade pelas ações de atenção à saúde dos indígenas para o Ministério da Saúde, mas as aeronaves que atendiam as comunidades a serviço da Funai não foram cedidas para essa finalidade. Entre os principais problemas identificados nas aeronaves estão pintura desgastada, sinais de corrosão na estrutura e até sucateamento de equipamentos. Foi o que foi ocorreu no aeroporto de Jacarepaguá, no Rio de Janeiro, onde a equipe de vistoria chegou a uma “espécie de cemitério de aeronaves” em matagal encharcado para avaliar “a aeronave ou o que restou dela”. “No seu interior não se encontrou mais nada além de um amontoado de restos de forro e de poltrona em decomposição”, diz o documento. Para a ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, que acompanhou pessoalmente o pente-fino na frota da Funai, o descaso é imperdoável. “Não vamos encontrar todos os culpados, porque a gente percebe que parte da culpa foi a própria burocracia que o sistema impõe. Temos aeronaves em pátios particulares, e a cobrança está chegando. O que nós vamos apurar no leilão não paga o que está sendo cobrado por pátios particulares. É um absurdo, é insuportável ver isso”, disse Damares. Enquanto a frota da Funai se deteriora, o Estado apurou que o Ministério da Saúde gasta cerca de R$ 80 milhões ao ano com o aluguel de aeronaves particulares contratadas para garantir assistência aos povos indígenas. A hora-voo de uma aeronave custa, em média, R$ 2 mil. O papel da Funai também vai entrar no centro do debate do Supremo Tribunal Federal (STF) no dia 1.º de agosto, quando o tribunal retoma suas atividades. O plenário vai decidir se confirma ou não decisão do ministro Luís Roberto Barroso que suspendeu trecho de medida provisória que transferia a competência para demarcar terras indígenas para o Ministério da Agricultura.
Estadão