Paulo Correa: Lobby de empresários e gestores atenta contra cultura junina do Nordeste

“Sou criador da Marinete e do Fórum do Forró. Isso ninguém pode tomar de mim”


O agente cultural Paulo Correa Sobrinho e o advogado e político Marcelo Déda têm dois pontos em comum: ambos nascerem no mesmo dia 11 de março de 1960 – um em Lagarto e o outro em Simão Dias – e ambos criaram, 41 anos depois, o Fórum do Forró de Aracaju e a Marinete do Forró em Aracaju.

A ideia das duas iniciativas foi concebida e apresentada por Paulo Correa, via Chico Buchinho, ao então prefeito Marcelo Déda, que viria a se tonar governador do Estado. E ele aprovou.

Por essas e por outras, Paulo Correa se constituiu numa figura pública e privada de muito respeito quando estão em pauta, entre outros temas, a música nordestina, seus múltiplos ritmos, seus mitos e sobretudo as tradições que ela ajuda a emoldurar no torno de junho.

Neste sentido, Paulo Correa pressente e denuncia graves ameaças à música, à tradição e à cultura nordestinas em seu ciclo clássico de junho quando figuras vestais do breganejo roubam a cena e se impõem ao picadeiro como protagonistas.

Para Paulo, não tem cabimento que uma dupla como Bruno e Marrone seja elevada à atração principal de uma festa junina em qualquer cidade do Nordeste. “Não há nenhuma lógica”, adverte.

E levanta uma lebre plausível para quando isso acontece – e olha que acontece com insistência. “A única lógica nisso é exclusivamente a de atender à demanda de mercado e atender a interesses econômicos por causa de empresários nacionais, empresários locais e até gestores públicos, porque esses artistas só entram na programação na concordância, obviamente, dos gestores dos municípios e dos Estados”, diz Paulo.

E qual o prejuízo disso para a nação nordestina? “No período junino, por ter geralmente uma duração de 30 dias, você tem um grande fluxo de turistas de todo o Brasil e também do exterior passando pelo Nordeste. Isso é uma chance única de você mostrar exatamente todo aquele conteúdo da cultura desse povo, através da dança, da música, da culinária, das manifestações, do artesanato, da literatura de cordel”, defende Correa.

Assim como defende a cultura geral da região Nordeste contra a invasão bárbara das tradições de outras regiões do Brasil, Paulo Correaprotege a si mesmo da tentativa de despojá-lo da condição de inventor do Fórum do Forró e da Marinete do Forró.

“Em síntese, sou criador da Marinete e do Fórum do Forró. Isso ninguém pode tomar de mim. Eu elaborei os dois projetos, entreguei para Chico Buchinho e inclusive quando ele foi levá-los para Marcelo Déda para ver se ele aprovava, o prefeito ficou impressionado quando viu a proposta de programação do 1° Fórum do Forró”, diz.

“Diria que Déda ficou extremamente surpreso e disse: “Esses nomes já aceitaram?” Eram os compositores Onildo Almeida e João Silva, dois parceiros de Luiz Gonzaga, e o jornalista Fernando Faro”, diz Paulo, revelando contrariedade quando identifica figuras outras querendo se apropriar da criação do  Fórum do Forró – ele aponta diretamente o professor José Paulino da Silva.

MAIS RESPEITO À DIVERSIFICAÇÃO DO SÃO DE ARACAJU
“Acho fundamental que Aracaju incentive com mais ênfase o São João da rua São João, porque todo ano o pessoal dali tem muita dificuldade de indefinição de se vai ter programação de festejo junino – veja que a rua São João já tem 109 anos de tradição”

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Paulo Correa e irmão Lino: gosto pelas coisas de junho vem da infância e da adolescência em Lagarto lá dos anos 60 e 70

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O bebê Paulo Correa, desde 11.03.1960, em festa e de olhar atento para o que viria da vida e da música do Nordeste

JLPolítica – Pode se negar que existe uma cultura exclusivamente junina no Nordeste?
Paulo Correa – 
Não. Porque essa cultura existe. Essa cultura é um fato, ela existe e está enraizada ainda hoje na memória coletiva dos nordestinos. E ela é muito importante.

JLPolítica – Por que?
PC – 
Porque eu acho inclusive que ela é uma questão de sobrevivência da própria identidade do povo nordestino, porque se você não preserva uma identidade cultural, você fica numa representação de um povo sem cara. Se você começar a juntar tudo que é cultura, misturar tudo, você acaba não tendo nenhuma, como diz a famosa frase atribuída a Leon Tolstói: se queres ser universal, comece por sua aldeia.

JLPolítica – Mas o senhor não vê o São João cada ano mais aculturado? Mais crivado por valores que fogem aos do ciclo da colheita do milho, da religião, dos cinco anos do seu ciclo – não esqueçamos de São José, lá em março, São Paulo, ao lado de Antônio, João e Pedro?
PC –
 Sim. O São João, infelizmente tem sido tomado nesses últimos anos por um forte movimento empresarial, desses empresários de show, que conseguem se impor junto à maioria dos municípios de todo o Nordeste.

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Paulo Correa, o cantor e compositor Lula Ribeiro e Tetê Espíndola, no primeiro show de Lula no Circo Voador, no Rio de Janeiro

JLPolítica – Não seria um problema circunscrito a Sergipe.
PC – 
Não é uma coisa exclusiva de Sergipe ou da Bahia. Está espalhada por todo o Nordeste. Uma força empresarial muito grande, de grandes empresários nacionais que resolveram delimitar a música brasileira em um ou dois ritmos. Ou seja, a gente já teve fases da música brasileira em que sempre tinha algum movimento dentro dessa música. Mas dos anos 80 pra cá, esses empresários resolveram em cada década escolher um ritmo e ficar expondo excessivamente.

JLPolítica – O que há de gravidade nisso?
PC – 
O grave é que não é um ritmo nordestino e também por ser exatamente só comercial, que não preza por uma boa melodia, um boa harmonia e muito menos qualquer concepção de boa letra ou poesia.

JLPolítica – O senhor acha natural que bandas, cantoras, cantores ou duplas breganejas   assumam o posto top na grade do São João de Sergipe?
PC –
 Eu acho uma tremenda contradição e é disso que eu estou falando. Porque o período junino, por ter geralmente uma duração de 30 dias, você tem um grande fluxo de turistas de todo o Brasil e também do exterior passando pelo Nordeste. Isso é uma chance única de você mostrar exatamente todo aquele conteúdo da cultura desse povo, através da dança, da música, da culinária, das manifestações, do artesanato, da literatura de cordel. Você tem essa chance única de mostrar a esse grande número de turistas que está passando pela região e se está perdendo uma chance enorme para que esses turistas de todo o Brasil e de todo o mundo levem a lembrança da cultura dessa região, que é muito bonita e forte.

DA DESCARACTERIZAÇÃO DAS QUADRILHAS JUNINAS
“Hoje você não vê quase quadrilha nenhuma fazer uma sequência de ritmos, ter uma parte da apresentação tocando xote, outra tocando xaxado, outra tocando baião, tocando forró. Você vê que tudo é montado para um encenação, sempre escolhem um tema fabulista”

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Paulo Correa, numa das muitas e merecidas premiações em nome da causa musical Nordestina

JLPolítica – O senhor entende que a invasão de uma outra música causa prejuízo ao arsenal de valores da cultura nordestina?
PC –
 Sim. Causa o prejuízo exatamente de se apagar, tirar do registro, e as novas gerações ficarem aculturadas. As novas gerações que são formadas, as próprias escolas, a educação, têm um papel fundamental, porque as escolas deveriam também estar se preocupando com isso. Algumas isoladamente até fazem ações para divulgar essa identidade cultural do ciclo junino no Nordeste. A importância disso. Mas é um número muito pequeno em relação ao total. Ou seja, educação, cultura e turismo são três segmentos que deveriam estar o tempo juntos, atrelados um ao outro, porque isso é o que ajuda a manter não só a identidade cultural do povo, mas a dar visibilidade no Brasil e no mundo. Dá possibilidade até de você expor e de ter um fluxo de negócio da economia.

JLPolítica – Há lógica que uma dupla como Bruno e Marrone atropele e suceda herdeiros de Luiz Gonzaga nas noites tão brasileiras de junho no Nordeste?
PC –
 Não há nenhuma lógica. A única lógica nisso é exclusivamente a de atender à demanda de mercado e atender a interesses econômicos por causa de empresários nacionais, empresários locais e até gestores públicos, porque esses artistas só entram na programação na concordância, obviamente, dos gestores dos municípios e dos Estados.

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Núcleo central da família Correa nos anos 70: em pé, Paulo, José Correa e Orlette, Lino e Aline, no colo, e sentados, João e Emília Corrêa, hoje vereadora de Aracaju

JLPolítica – Mas negá-los não seria uma espécie de xenofobismo, bairrismo e uma apartação entre as culturas do Nordeste e do Centro-Oeste do Brasil?
PC – 
De maneira nenhuma. Você conhece alguma outra região no Brasil, onde no ciclo junino artistas como Jorge De Altinho, Flávio José, Elba Ramalho, Santana, O Cantador, Trio Nordestino tem acesso? Eles se apresentam nesse período do ciclo junino em São Paulo, em Barretos, em Goiânia, no Rio de Janeiro? Você vê esses artistas na grade dessas praças? Não vê. Então ninguém estaria embarreirando ninguém por aqui. Esses artistas que fazem esse ritmo da festa junina são naturais dela. Quem lançou esse ritmo pelo Brasil e pelo mundo foi Luiz Gonzaga, Jackson do Pandeiro, Dominguinhos, Marines – tudo nordestino. E como é que os artistas que fazem esse ritmos saem da grade de programação para colocar outros que não têm nada a ver com esse setor exatamente em junho?

JLPolítica – É impossível enquadrar o desejo do político, geralmente promotor da festa, que quer circo e voto, com valores, digamos, mais culturais?
PC – 
Não. Não acho impossível não. Eu acho que, inclusive, precisa ter essa sensibilidade, porque até o momento, cada vez mais pelo que o nosso país passa, com mais dificuldades a cada ano, em nível de Estado e de município. Se o Estado e o município têm dificuldades financeiras para tocar as suas atribuições, você tem que ter uma visão de dar prioridade ao que é fundamental investir ou não. E a cultura, o turismo, a educação acho que são coisas fundamentais de investimento. Por esse mesmo motivo, é até desinteligente você montar uma programação junina com artistas caros, de cachês altíssimos mas dissociados da realidade dos ritmos do São João. Então não tem nenhuma explicação, a não ser a explicação pura e simples de que tem gente ganhando muito dinheiro com esses artistas se apresentando o ano todo, inclusive, nas festas juninas.

A ORQUESTRA SANFÔNICA SEGUE EM FRENTE
“Nossa Orquestra Sanfônica está em uma nova fase. Ela hoje é uma ONG independente, tem vida própria. Ela já completou 12 anos de atividade, está ativa com o nosso maestro Evanilson. Ela continua bem ativa”

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Família Correa nos anos 2000: em pé, a Aline, Emília, João e Paulo. Sentados, Orlette e José Correa. Agachado, Lino Correa

JLPolítica – É justo termos duas festas públicas, uma na zona dos mercados e a outra na Atalaia? A fusão em um único evento maior e mais alongado no tempo não daria retorno melhor?
PC – 
Nesse caso eu acho justo. Acho, inclusive, que assim como já houve no passado os barracões culturais que faziam festejos juninos nos bairros, é muito interessante você não ter festejo em um lugar só. Então eu creio que dá para conviver tranquilamente duas festas. Acho muito interessante o Governo do Estado fazer o São João na Orla da capital e a Prefeitura no mercado. Mas acho muito interessante e seria fundamental que Aracaju incentive com mais ênfase o São João da rua São João, porque todo ano o pessoal dali tem muita dificuldade de indefinição de se vai ter programação de festejo junino – veja que a rua São João já tem 109 anos de tradição. E também acho muito interessante que o município pense em fazer São João, por exemplo, nos grandes bairros de Aracaju, seja no Augusto Franco, no Bugio, no Siqueira Campos. Acho que essa coisa da descentralização, até por causa do costume da população não ter dinheiro para estar se deslocando todo dia para a rua do ponto, interessante.

JLPolítica – Como é que o senhor vê a performance das quadrilhas juninas cada vez mais espetaculosas e carnavalescas, como se estivessem sob muita afetação, sempre em busca de um suposto sambódromo?
PC –
 Eu vejo isso uma com tristeza imensa. Eu, inclusive, tenho assistido muito pouco à exibição dessas quadrilhas juninas. Eu não tenho conseguido paciência, porque aquilo parece simplesmente uma carnavalização, uma teatralização afetada. As quadrilhas juninas se tornaram uma tradição na cultura dos festejos de junho. Elas sempre se destacavam porque eram a representação da dança dos ritmos que compõem o ciclo de junino.

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Paulo Correa e a sua bem-grudada esposa Kalina Elizabete Lopes Correa

JLPolítica – E hoje?
PC – 
Hoje você não vê quase quadrilha nenhuma fazer uma sequência de ritmos, ter uma parte da apresentação tocando xote, outra parte tocando xaxado, outra tocando baião, tocando forró. Você vê que tudo é montado para um encenação, sempre escolhem um tema fabulista. Esse ano eu vi uma quadrilha que escolheu um tema tropicália – ou seja, o que a tropicália tem dentro do contexto junino? E outra coisa é a preocupação também com roupa. As roupas fazem as quadrilhas juninas terem um custo altíssimo, porque se esqueceram de todo o contexto da simplicidade delas.

JLPolítica – Sergipe estaria bem representada por bandas, cantores e compositores basicamente do ciclo do forró?
PC – 
Olha, a gente tem grandes cantores e compositores. Está surgindo, inclusive, uma nova geração de grandes cantores e compositores da música nordestina e também sergipana, porque alguns conseguem até fazer um trabalho fora daqui.

AUTOR DO FORRÓ DE FORRÓ DE ARACAJU
“O Forró de Forró de Aracaju nasceu em 2001, no primeiro ano da gestão de Marcelo Déda prefeito, quando o João Francisco Santos, Chico Buchinho, me convidou para trabalhar com ele lá na Funcaju. Déda então aprovou de imediato”

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Paulo fia bem no meio musical. Como a linha e o linho: aqui, com o compositor Onildo Almeida e o Rei Luiz Gonzaga, em Caruaru, Pernambuco, no São João de 1987

JLPolítica – Exemplos…
PC – 
No caso de Sergipe, a maior estrela, o sanfoneiro mais requisitado do Brasil, é um sergipano de Itabaiana: Mestrinho, filho do nosso Erivaldo de Carira, que também marca há de 30 anos. Mas você tem, além do Mestrinho, vários cantores, sanfoneiros, que estão participando de festivais de forró e ganhando. Eu cito por exemplo um dos festivais mais famosos de forró do Brasil, que é o de Itaúna, no litoral do Espírito Santo, e que já teve em algumas edições vencedor de Sergipe, com o cantor Erick Souza. Ele ganhou o primeiro lugar de melhor cantor. O Glauber Santos já ganhou também como melhor sanfoneiro do mesmo festival de Itaúnas. O maestro Evanilson já classificou com músicas em primeiro e segundo lugares em festivais, tanto no festival do Espírito Santo quanto no Festival de Forró de João Pessoa, na Paraíba. Ou seja, tem tanto em termos de compositor quanto de instrumentista e de cantor se destacando em festivais de forró que acontecem no Brasil. Os mais famosos são esse de Itaúnas, um que acontecia em São Paulo e está acontecendo agora em Belo Horizonte. João Pessoa também está fazendo um anualmente.

JLPolítica – O que foi feito da Orquestra Sanfônica de Sergipe?
PC – 
Olha, a nossa Orquestra Sanfônica está em uma nova fase. Ela hoje é uma ONG independente, tem vida própria. Ela já completou 12 anos de atividade, está ativa com o nosso maestro Evanilson, que foi exatamente ele que a formou na época em que ele ainda estava dando aula de acordeom na escola Valdice Teles, em Aracaju, mas depois o município parou de dar esse incentivo à orquestra e ela começou a ficar com pouca atividade. Foi quando os membros se reuniram e decidiram que iriam dar continuidade à história da Orquestra Sanfônica. Então, hoje ela continua bem ativa, com sede em Aracaju e faz apresentações em Aracaju e outros Estados.

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Com Chico Buarque de Holanda, o maior compositor brasileiro de todos os tempos, no Teatro Fênix, da Rede Globo, nos bastidores do Programa Chico & Caetano, nos anos 80, Rio de Janeiro

JLPolítica – Ela teve algumas performances fora de Sergipe.
PC – 
Sim. A Orquestra Sanfônica chegou a se apresentar com Dominguinhos, lá no programa Altas Horas, com o Serginho Groisman, na Globo. Se apresentou no Festival Internacional da Sanfona, em Juazeiro, na Bahia. E hoje ela é independente. Formou grandes sanfoneiros. O Glauber Santos, que hoje é um dos nossos melhores sanfoneiros, foi formado por ela. O Lucas Campelo também foi aluno do maestro Evanilson, que hoje faz parte da Orquestra Sanfônica. O Robertinho dos 8 Baixos não se formou na Orquestra Sanfônica, obviamente, mas faz parte dela. Edgar do Acordeom, o Joaquim da Casaco de Couro também já passaram pela Sanfônica.

JLPolítica – Em que ponto Estância ganha para Areia Branca na caracterização das festas juninas?
PC – 
Eu acho que Estância ganha muito na tradição dos festejos juninos. Tem muito mais tempo de festejos juninos do que Areia Branca. Tem mais elementos culturais, coisas que são somente em Estância se vê, como o barco de fogo, que é uma invenção do São João dali e que não existe em nenhum outro lugar do Brasil. Em nenhum outro município. A própria Guerra de Buscapés, também é uma tradição de Estância, então ela tem um conteúdo de tradição bem maior que o de Areia Branca. Esse município teve uma fase inicial, onde teve grandes shows e depois disso deu uma reduzida grande e agora ela praticamente faliu, sendo apenas no dia 31 de maio.

FÓRUM DE FORRÓ COMO FOMENTO MUSICAL
“Eu constatei que depois dessa sequência do Fórum do Forró o surgimento aqui em Sergipe, aqui em Aracaju, de inúmeros artistas que fazem forró. E não só de inúmeros cantores, mas também o surgimento de inúmeros compositores”

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Em outro tom e gênero musical: com Milton Bituca Nascimento, no Jazzmania, no Rio de Janeiro, em 1994

JLPolítica – Como e quando é que nasce o Fórum do Forró de Aracaju?
PC – 
Olha, o Forró de Forró de Aracaju nasceu em 2001, no primeiro ano da gestão de Marcelo Déda prefeito, quando o João Francisco Santos, Chico Buchinho, me convidou para trabalhar com ele lá na Funcaju. Lá e cheguei já pensando em duas propostas para inovar, trazer algo novo para o São João para que a festa não se limitasse apenas à apresentação de shows artísticos. Uma delas foi o Fórum e a outra foi a Marinete do Forró, e todas as duas ideias foram apresentadas por mim em 2001. Ao me convidar, Chico me disse: “Olhe, Paulo, então me traga os projetos”.

JLPolítica – E como o senhor fez?
PC – 
Eu elaborei os dois projetos, entreguei para Chico e inclusive quando ele foi levá-los para Marcelo Déda para ver se ele aprovava, o prefeito ficou impressionado quando viu a proposta de programação do 1° Fórum do Forró. Diria que Déda ficou extremamente surpreso e disse: “Esses nomes já aceitaram?” Eram os compositores Onildo Almeida e João Silva, dois parceiros de Luiz Gonzaga, e o jornalista Fernando Faro. Pouca gente sabia que o grande Faro era um sergipano. Dissemos que já estavam contados e que aceitaram. Déda então aprovou de imediato.

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Com a esposa Kalina e o matuto mais universal do Brasil, o poeta Jessier Quirino

JLPolítica – A marinete continua ativa ou não?
PC – 
A Marinete do Forró continua ativa até hoje anualmente. Inclusive a Marinete, por causa da repercussão como um veículo – um projeto itinerante que leva o turista aos pontos tradicionais de turismo da nossa capital ao som do típico forró pé de serra – começaram a estender o período da Marinete. Ela não circula mais só no mês de junho. Existe agora também a Marinete durante o verão. Em síntese, sou criador da Marinete e do Fórum do Forró. Isso ninguém pode tomar de mim.

JLPolítica – Que tipo de contributo esse Fórum do Forró prestou à música nordestina neste tempo todo?
PC – 
Olha, eu percebo que deu uma contribuição fundamental. Eu constatei que depois dessa sequência do Fórum do Forró o surgimento aqui em Sergipe, aqui em Aracaju, de inúmeros artistas que fazem forró. E não só o surgimento desses inúmeros cantores, mas também o surgimento de inúmeros compositores. Antes da realização das edições do Fórum do Forró você contava nos dedos quantos artistas compunham o forró e quantos deles gravavam. Surgiu uma geração muito nova, muitos jovens que despertaram para esse ritmo. A partir dali vem se conhecendo grandes nomes da música nordestina.

DOS EQUÍVOCOS DE JOSÉ PAULINO
“Pelo que eu vi o José Paulino dando depoimento em duas emissoras de rádio, ele fez uma grande confusão na cabeça, um grande equívoco. Mas já seria tempo de ele refletir e ver que houve esse um equívoco”

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Prensado pela dinastia do forró: com Liv Moares e o grandioso Dominguinhos

JLPolítica – Os debates e eventos geraram algum tipo de mídia duradoura – livro, vídeo, filme-documentários? Ou desceram pelas valas das enxurradas?
PC – 
Olha, infelizmente esse é um ponto que foi muito falho. Até hoje só existe uma única publicação de edição de Fórum do Forró, que foi o da 6ª edição, que homenageou Camélia Alves e Humberto Teixeira. Esse foi o único Fórum em que os anais foram registrados, com todas as palestras e debates.

JLPolítica – O senhor tem se queixado de que há gente querendo se apropriar da criação do Fórum do Forro de Aracaju. Quem são e como isso se dá isso?
PC – 
Olha, eu fico de certa maneira constrangido com esse tema, porque, por algumas vezes, algumas pessoas vinham e comentavam a mim que determinada pessoa estava se autoproclamando autora do Fórum do forró e algumas vezes depoimentos presenciais dessa figura casualmente que aconteciam. Uma vez eu encontrei um primo no aeroporto de Aracaju com o Dr. Carlos Hermínio, que já foi reitor da UFS. Na época eu tinha ido pegar os compositores Antonio Barros e Ceceu, que estavam chegando no aeroporto, para participar, se eu não me engano, da segunda ou da terceira edição do Fórum do Forró, e ouvi ali que um certo ex-professor da UFS espalhava ser ele o criador do Fórum.

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Paulo Correa entrevistando o jornalista e compositor Hugo Costa, autor do Hino do Batistão, gravado por Gonzaga no sombrio 1968

JLPolítica – O senhor tem dito que é o professor José Paulino. Ele não tem se confundiu com outro evento?
PC –
 Para mim, pelo que eu vi o José Paulino dando depoimento em duas emissoras de rádio, ele fez uma grande confusão na cabeça, um grande equívoco. Mas já seria tempo de ele refletir e ver que houve esse um equívoco. Ele faz referência que o Fórum foi um projeto criado por alguns autores e pessoas, e inclusive me citando. Eu, ele, o Chico Buchinho. Mas na verdade, o que pra mim ficou bem claro é que Zé Paulino está se referindo a um projeto da época da gestão de Chico ainda na Funcaju, mas depois da realização do primeiro Fórum do Forró, no segundo semestre de 2001.

JLPolítica – Que projeto seria esse?
PC – 
Na época, o Chico convidou o professor Paulino para assumir a Coordenação de Patrimônio da Funcaju. E reuniu a equipe – eu, o professor Paulino, o próprio Chico -, e pediu para que a gente fizesse um projeto de captação para Lei Rouanet para o Forró Caju de 2002 e nesse texto do projeto, entre as atividades que o Forró Caju desempenhariam constatava o Fórum do Forró e a Marinete do Forró, que eram coisas que já tinham sido criadas em junho de 2001. Mas não por Zé Paulino, porque esses projetos fui eu que fiz. Eu não tenho nenhuma vaidade. Pelo contrário, para mim podia ser até uma honra que ele os tivesse criado. Mas não foi.

DE FÓRUM DO FORRÓ A FÓRUM DA MÚSICA NORDESTINA?
“A intenção que vem na minha cabeça de fazer duas edições no ano é porque a música nordestina não se resume simplesmente aos ritmos do ciclo junino. Você tem grandes nomes da música nordestina que merecem ser homenageados”

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A trupe dos irmãos Correa: Lino, Paulo, Emília, João e Aline

JLPolítica – Por que esta migração agora de Fórum do Forró de Aracaju para Fórum Nacional da Música Nordestina?
CP – 
Para falar a verdade, não foi nem uma migração propriamente dita. Na verdade, o que aconteceu é que durante todos esses períodos do Fórum do Forró, ocorreu de umas duas ou três edições de não acontecer. A primeira vez foi por uma indefinição, porque eu tinha uma proposta de homenageado e na época o prefeito Edvaldo Nogueira tinha a intenção de fazer uma outra, era a Elba Ramalho. E se ficou esperando a definição dela. O tempo foi passando, não teve nenhuma confirmação e não houve tempo de ser realizado. Isso foi em 2006. E dois outros anos ficaram sem realização, também por indefinição da Prefeitura.

JLPolítica – E aí se decidiu mudar de nome e foco?
CP – 
Por causa dessas indefinições, eu já estava com uma outra proposta para o Fórum, continuando com essa ideia de um evento com mais independência, sem estar atrelado ao poder público. Então, desde dezembro do ano passado que já vinha conversando com algumas pessoas da música e também da obra de Jackson do Pandeiro, porque esse ano é emblemático: são os 100 dele. Para mim, isso teria que ser o tema de um Fórum, de uma discussão sobre forró. Seria feito também em parceria com Estado, porque quando eu já estava com os nomes consultados e aprovados para uma programação, vendo algumas alternativas de apoio, surgiu o interesse da Funcap, que hoje substitui a Secretaria de Cultura, a fim de colocar o Fórum dentro do Encontro Nordestino de Cultura. Como já havia programação consensuada, foi o tempo hábil para que a gente pudesse realizar, com Jackson na pauta.

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Paulo Correa combate, doma os carcarás da cultura nordestina e enfrenta os preconceitos acadêmicos, como um Luiz Antonio Barreto

JLPolítica – Por que o senhor pensa em fazer duas edições anuais do Fórum Nacional da Música Nordestina? A segunda se encaixaria em que mês?
PC – 
A intenção que vem na minha cabeça de fazer duas edições no ano é porque a música nordestina não se resume simplesmente aos ritmos do ciclo junino. Você tem grandes nomes da música nordestina que merecem ser homenageados, sem estar necessariamente atrelado ao ciclo junino. Então no segundo semestre a gente está pensando numa linha mais aberta do que essa do forró. E que se algum ano o governo não tivesse interesse, eu não ficaria impedido de realizar uma outra edição de forma independente, ou até com o apoio de empresariado privado.

JLPolítica – Serve a quem a briga para demonstrar quem, entre Jackson do Pandeiro e Luiz Gonzaga, é mais importante à música nordestina?
PC –
Para mim, não serve a ninguém. Porque Jackson e Luiz Gonzaga têm cada um sua importância e são referências para vários artistas de vários estilos musicais no Brasil. Todos dois tinham uma proposta musical muito bem definida. E distintas. O Gonzaga sempre foi de levar para o Brasil e para o mundo a história do Brasil do interior, do Brasil rural, no Nordeste. Ele retratava como nenhum outro as questões do Brasil do interior do Nordeste. Da seca, dos afetos, de tudo.

DIFERENÇAS E SEMELHANÇAS ENTRE JACKSON E GONZAGA
“Gonzaga sempre levou a música dele como uma bandeira de luta. Uma bandeira de mostrar ao Brasil e ao mundo os ritmos que compunham a música nordestina e mostrar a força do homem do Nordeste. O Jackson já era uma obra mais urbana”

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Em sintonia com os pais Orlette e José Correa

JLPolítica – E o Jackson?
PC – 
O Jackson já era uma obra mais urbana, uma visão totalmente urbana. E outra coisa: Gonzaga sempre levou a música dele como uma bandeira, uma bandeira de luta. Uma bandeira de mostrar ao Brasil e ao mundo os ritmos que compunham a música nordestina e mostrar a força do homem do Nordeste, além da dificuldade do homem do Nordeste sobreviver pelas intempéries da seca. Mas Jackson não lhe é inferior.

JLPolítica – Numa comparação, Gonzaga estaria mais para Beatles e Jackson para Rolling Stones?
PC –
 Sim, concordo com essa comparação. Há outra comparação, que também acho perfeita: Alceu Valença considerava Luiz Gonzaga o Pelé da música nordestina e Jackson, o Garrincha. Eu acho isso perfeito. Porque Pelé é até hoje o atleta mais completo do mundo. Ele treinava excessivamente, tinha uma dedicação muito grande. E Garrincha era o contrário: era a parte artística. Um talento tão grande quanto o de Pelé, mas com estilo diferente.

JLPolítica – Não estaria na hora de a música nordestina perder essa delimitação rotular geográfica e ganhar ares de música do Brasil?
PC –
 Com certeza. Em uma das últimas vezes em que Gilberto Gil veio participar do São João aqui, eu tive a oportunidade de entrevistá-lo e perguntei a ele que ritmos da música do Brasil ele considerava ritmos nacionais. E ele citou dois de imediato: o samba e o baião.

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A família Correa numa praça da bucólica Lagarto dos anos 70

Fonte: JLPolítica

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