Brasil tem 250 casos de tortura ou violência psicológica contra crianças e adolescentes por dia

Dados são da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP)

Foto Ilustrativa/Agência Brasil
Foto Ilustrativa/Agência Brasil

 

Todos os dias, são notificados no Brasil uma média de 243 agressões de diferentes tipos (física, psicológica e tortura) contra crianças e adolescentes, entre o nascimento e 19 anos de idade. Em menores de quatro anos, nos últimos anos foram registrados pelo menos 25 casos por dia.

Somente no ano de 2019, a soma desses três tipos de registro chega a 88.572 notificações. Cerca de 60% dessas situações tiveram como local de ocorrência declarada o ambiente doméstico e grande parte têm como autores pessoas do círculo familiar e de convivência das vítimas, evidenciando que as vítimas permanecem reféns de seus agressores.

Os dados foram extraídos pela Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), com o apoio da equipe da 360° CI, do Sistema Nacional de Agravos de Notificação (Sinan), mantido pelo Ministério da Saúde. Apesar do volume significativo de registros, os especialistas acreditam que o número são apenas a ponta do iceberg e que a subnotificação não revela o cenário provavelmente pior.

Desse total de casos notificados pelos serviços de saúde, 71% (62.537) são decorrentes de violência física; 27% (23.693) de violência psicológica; e 3% (2.342) de episódios de tortura. Este levantamento não considerou variações como violência e assédio sexual, trabalho infantil, entre outros tipos de agressão, que serão abordados pela SBP em publicação posterior.

Ao analisar a série histórica nos últimos dez anos – 2010 a 2019 (dados mais recentes disponíveis), o volume de agressões chega a 629.526 registros, ou 173 casos por dia. Impressiona que desde a implantação dessa plataforma, os registros têm crescido de forma consistente. Em 2010, foram 24.040 notificações (média de 66 por dia). Em 2019, foram 88.572. No período analisado, o aumento foi de 268%.

“O recente caso do menino Henry Borel traz, em si, a indignação de toda a sociedade brasileira, sobretudo dos pediatras, que, diariamente, se deparam em seus consultórios com os mais diversos desrespeitos e afrontas à integridade física, psicológica e moral das crianças e adolescentes”, lamentou a presidente da SBP, Dra. Luciana Rodrigues Silva.

Vulneráveis – Pelos dados do Sinan, é possível observar que as agressões atingem todas as faixas etárias da população pediátrica. Quase 25 mil casos notificados nas unidades de saúde das redes pública e privada ao longo da última década diziam respeito a bebês menores de um ano. Outros 51,3 mil registros envolviam crianças de um a quatro anos.

“Esses números são apenas a ponta de um enorme iceberg. A subnotificação é uma realidade, ou seja, o total de casos que não chega ao atendimento médico nem ao conhecimento das autoridades, é significativa”, explica o dr. Marco Antônio Chaves Gama, presidente do Departamento Científico de Segurança da SBP.

Segundo ele, muitas situações de violência não são encaminhadas aos locais de atendimento à saúde, pois os agressores não levam as vítimas para receber cuidados, o que geralmente só acontece quando a violência assume proporções graves ou com risco de morte.

Apesar do encaminhamento da notificação não constituir denúncia policial contra os autores da violência, ele é o disparador da linha de cuidados voltadas para pessoas em situação de risco. Mas, não garante a assistência integral e as ações de proteção emergenciais que muitos casos demandam.

A notificação da violência ou de sua simples suspeita é compulsória pelo Ministério da Saúde e obrigatória pela Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), devendo ser feita ao Conselho Tutelar da região e ao Ministério Público nas situações crônicas ou de maior gravidade. Em caso de crimes, como as violências físicas que deixam lesões, as psíquicas com repercussão na vida da criança e sexuais, comprovadas ou de suspeita, as delegacias de polícia devem ser notificadas também.

Além disso, destaca o dr. Marco Gama, estudos pontuais em todo o mundo já indicam que a crise sanitária e a necessidade do isolamento social causados pelo coronavírus tem agravado esse cenário de violência no último ano. “Infelizmente, a casa não é um lugar seguro para todos, pois muitas crianças e adolescentes da família precisam compartilhar esse espaço com a pessoa que os violenta”, disse.

Distribuição – Com respeito à distribuição geográfica dos casos, o Sinan mostra que, em números absolutos, as ocorrências desses tipos de violência, em 2019, foram maiores nos seguintes estados: São Paulo (20.768 casos), Minas Gerais (13.101), Paraná (8.712), Rio de Janeiro (7.714) e Pernambuco (4.285).

Na última década, o acumulado de notificações aponta o seguinte cenário, por estado: São Paulo (138.460), Minas Gerais (96.287), Paraná (54.884), Rio de Janeiro (49.827) e Rio Grande do Sul (42.791).

Orientação aos médicos – Desde 2004 a SBP, através de seu DC de Segurança tem feito publicações para o enfrentamento da violência contra crianças e adolescentes, em manuais, capítulos do tratado de pediatria, livros para pais e documentos científicos.

Em 2018, o grupo lançou o ” Protocolo de Abordagem da Criança ou Adolescente Vítima de Violência Doméstica”, com o detalhamento do diagnóstico e dos encaminhamentos necessários em caso de suspeita de violência, cujo objetivo é orientar os especialistas no reconhecimento das várias formas de maus-tratos e na adequada condução dessas complexas situações. No mesmo ano, a entidade também disponibilizou gratuitamente em seu portal uma nova edição do ” Manual de Atendimento às Crianças e Adolescentes Vítimas de Violência “.

O livro tem o intuito de discutir estratégias para prevenir, identificar e encaminhar situações de risco de violência em nível doméstico, na escola e nos ambientes públicos. O documento tem como público-alvo os profissionais que atuam diretamente com a população pediátrica nas áreas da saúde, educação, assistência social, psicologia, segurança, justiça e mídia.

Fonte: Bahia.ba

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